O dia era frio e chuvoso e nesses dias ela ficava melancólica e chata. Resolveu arrumar algumas gavetas, afinal de contas o dia não colaborava para uma saída.
Selecionou uma playlist do Chico Buarque e logo jogou todas as coisas da primeira gaveta na cama, a primeira foi fácil, só tinha algumas bijuterias e maquiagens que não usava mais, mas mesmo assim as guardava, pois quem sabe um dia, né? Na verdade ela não gostava muito de jogar as coisas fora, geralmente colocava tudo no fundo da última gaveta, que essa sim, daria um pouco mais de trabalho para arrumar.
Enquanto as músicas tocavam, seus pensamentos vagavam e pensava: "Ah! Chico, só você para entender perfeitamente as mulheres.", suspirava, cantava e arrumava, nem sempre nessa ordem.
Enfim chegou a gaveta das coisas que não tem utilidade, mas que não se joga fora.
Lá tinha armações de óculos de grau, óculos escuros que não usava mais, uma calculadora sem bateria, uma caixinha com algumas fotos e uma outra caixinha com bilhetes, embalagens de chocolate, ingressos de cinema, uma carta e alguns e-mail´s impressos, o Relicário, quando a pegou, passou a mão por ela e pensou: "abro ou jogo fora?", como todas as mulheres ela abriu, é claro!
Olhou tudo delicadamente e por alguns minutos não estava mais naquele quarto e muito menos ouvindo Chico, releu os bilhetes e deu um sorriso triste de saudade, viu alguns e-mail´s e por fim chegou na carta, escrita em letra de forma, leu e releu e com os olhos cheios d´agua parou na frase: "Acredito que não da mais, muitas coisas mudaram, mas acredite ainda te quero por perto." Em meio as lágrimas deu um sorriso amargo e ficou repetindo essa frase por diversas vezes, com raiva dela mesmo por ter acreditado nisso por um bom tempo.
Pegou a caixa, arrumou tudo que tinha lá dentro e na hora em que estava guardando, num súbito jogou-a fora. Cansou de guardar coisas que sabe que não voltará a moda. Assim que acabou a última gaveta a playlist tocava "Apesar de você, amanhã há de ser outro dia..."
Enxugou as lágrimas, abriu um sorriso largo e de alívio e agradeceu ao Chico imensamente pelas palavras.
Neves, Michelle
